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Coluna do LAM

O lendário trampolim da Praia de Icaraí

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Há dias postei no Facebook essa foto que o Manoel Fonseca (foi colorizada) fez da implosão do trampolim da Praia de Icaraí, em 1964 ou 1965. Um amigo quase primo, Luiz Eduardo Soares, engenheiro, executivo da Technoblast viu, foi nos sites de busca tentar saber quem tinha feito a implosão (ele trabalha nessa área) e não encontrou. Luiz Eduardo, nascido e criado em Niterói, ex-aluno do Abel, era chamado por muitos de Luiz Zê. Vive em São Paulo há décadas.

Procurei também e não achei quase nada sobre o trampolim que foi, sim, uma marca profunda da história de Niterói. Se algum leitor tiver a informação, por favor deixe ali nos comentários.

O saudoso historiador Emmanuel de Macedo Soares com certeza teria a resposta no ato, mas ele não está mais entre nós. No entanto, Niterói abriga historiadores e pesquisadores de qualidade que certamente sabem tudo sobre o trampolim.

A obra (1936) foi feita a partir do projeto arquitetônico de Luiz Fossati. Em concreto armado, a estrutura foi idealizada para ter o formato de uma gaivota com as asas abertas (eu acho o desenho fantástico) . Ficava a cerca de 30 metros da areia, na altura da Rua Lopes Trovão e tinha entre cerca de 15 metros de altura.

Virou referência na cidade. Namorados marcavam encontros em frente ao trampolim. Na areia, na época limpa, de Icaraí, juntavam-se rodinhas de amigas e amigos para curtir a praia de água transparente, jogar frescobol ou fazer o que os mais antigos chamavam de footing, caminhar junto ao mar para, quem sabe, conseguir convidar alguém para um sorvete a noite. Quem saltava do “úlimo andar” do trampolim era herói, ou maluco.

Muita gente que se conheceu naquela faixa da praia, em frente a rua Lopes Trovão, acabou casando. Mas apesar do clima de romance, de um certo lirismo, quanto mais o tempo passava mais o trampolim se tornava um risco por causa dos vergalhões em sua base, cada vez mais expostos. O que se diz é que “muita gente morreu lá”, mas não achei um registro oficial. Mas fato é que virou um lugar proibido.

Aliás, parece que a palavra proibido é um carma da Praia de Icaraí. Com o despejo brutal de esgoto, poluição em geral, mergulhar em Icaraí virou insanidade a partir do final dos anos 1960. Muita gente contraiu doenças graves como hepatite. A areia esconde parasitas, bactérias e outros micro organismos.

Por isso, muitos médicos proíbem os pacientes de encostarem na areia, recomendando que usem cadeiras altas pois nem as cangas conseguem proteger. Há veterinários que recomendam que não se levem cachorros para a praia para evitar doenças. É incrível, boçalmente incrível, mas não existe um monitoramento sobre as condições sanitárias da areia e a medição da qualidade da água também está sob suspeita. Leia aqui: https://tinyurl.com/y3vfah84

No tempo do trampolim havia lagosta e polvo na região da Itapuca, pescava-se pampo no meio da Praia de Icaraí, e o próprio entorno do trampolim era rico em peixes. Mas por causa dos problemas estruturais, a construção foi se deteriorando ao longo dos anos e virou risco de vida para os banhistas. Como havia pedaços de concreto se soltando e vergalhões à mostra, as autoridades optaram por implodir a obra em 1964/65.

O ex-coordenador de Documentação e Pesquisa da FAN, Maurício Vasquez, disse em entrevista ao Globo em 2013, que não foi uma ressaca que danificou o trampolim como andaram dizendo.

– O grande problema foi que o trampolim foi feito e trazido pronto. Em vez de cavarem uma fundação, fizeram uma grande base de concreto e acreditou-se que, com o peso, ela ficaria perfeita. Então quando desceu, na hora de bater no fundo já não assentou do jeito que esperavam. Ele foi sendo abandonado aos poucos. Todas as pessoas de mais idade falam com saudades daquele tempo.

Em setembro de 2013 montaram naquela área uma plataforma de 27 metros para a disputa da sétima etapa do Circuito Mundial de salto de penhasco, indiretamente uma homenagem ao trampolim, mas houve um impedimento técnico e o evento não aconteceu.

Eu estudava o primário (hoje ensino fundamental) em um colégio na rua Oswaldo Cruz, em Icaraí, e lembro bem que a professora avisou que o trampolim estava sendo dinamitado. Quando eram detonadas as bombas uma sirene de aviso soava no bairro. E foi o que aconteceu. Pareciam sirenes de Londres na II Guerra, seguidas de explosões, como assistimos depois nos filmes.

P.S. – No final da tarde, equipes de garis tentam limpar a areia da Praia de Icaraí nas proximidades da arrebentação. Utilizavam até um trator. A chuva em cidades próximas enche o mar de lixo pesado (garrafas, tábuas, muitos ratos mortos, nojo total) que as ondas deixam na areia. Os garis limpam, mas cinco minutos depois o lixo era reposto pelo mar.

Em 1995 o Plano de Despoluição da Baía de Guanabara, que consumiu, na época 1 bilhão de dólares (mais de 5 bilhões de reais). Em 2012 o Estadão pulicou a matéria “Em 20 anos, despoluição da Baía de Guanabara vira esgoto”, de Felipe Werneck. No subtítulo: “Anunciado com pompa durante a Rio-92, programa já torrou US$ 1,17 bilhão e a baía continua imunda”. A matéria está neste link:  https://uc.socioambiental.org/noticia/111232

P.S. – Com o preço da energia elétrica ficou proibitivo para os prédios fazerem seus arranjos luminosos de Natal que encantavam a cidade, principalmente os idosos e as crianças. Mesmo com lâmpadas de led o preço da conta fica absurdo.

Uma pena que a cidade continue praticamente apagada, triste, justamente num ano sofrido de pandemia. A prefeitura poderia compensar dando um banho de luz na orla, tipo corredores luminosos e não ornamentações isoladas.

Aliás, está mais do que na hora de substituírem a velha, decadente e triste iluminação da Praia de Icaraí (a luz não chega, sequer, na beira bar) e encher de lâmpadas platinadas como as da avenida Atlântica. Além de alegrar a população pode inspirar a própria prefeitura que poderia copiar os modelos de quiosques de lá e construir no lugar dos barracos que ofendem o calçadão.

Luiz Antonio Mello

Jornalista, radialista e escritor, fundador da rádio Fluminense FM (A Maldita). Trabalhou na Rádio e no Jornal do Brasil, no Pasquim, Movimento, Estadão e O Fluminense, além das rádios Manchete e Band News. É consultor e produtor da Rádio Cult FM. Profissional eclético e autor de vários livros sobre a história do rádio e do rock and roll.

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