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Flores de Friburgo vão colorir o Barreto, bairro de passado glorioso em Niterói

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Botei gravata e vesti um blazer azul-marinho para visitar o Barreto, um bairro de classe média que teve importância industrial, comercial, política e educacional para Niterói. Essa região da Zona Norte, de passado glorioso, mas que acabou como apenas um bairro de passagem na ligação de São Gonçalo a ex-capital fluminense, vai voltar a florescer.

A grande notícia é que o conhecido mercado do Barreto, na Rua Galvão vai ser um ponto de venda das procuradas flores cultivadas em Nova Friburgo (foto), cidade maior produtora do estado e segunda do país (a primeira é Holambra, em São Paulo). A partir do próximo ano, as flores poderão ser encontradas na Central de Abastecimento de Niterói (Caden) – nome oficial do mercado. Vão voltar também as lojas de hortifruti. Vai ser a Cadeg niteroiense. E não vai faltar o bacalhau. A Caden já abriga há décadas o Empório Flaviense, do português Aristeu, além do antigo Restaurante Sabor da Hora.

A Caden tem 135 lojas em três blocos, com a venda voltada para laticínios, bebidas, material descartável e cestas básicas.  Numa pausa para o cafezinho soube que o bairro que já teve uma cooperativa de crédito e o Banco do Barreto, está restrito hoje a uma agência virtual do Bradesco, com caixas eletrônicos. Na hora do lazer, ninguém precisava deixar o bairro para ir ao cinema, pois tinha o Brasil, diante da Praça Enéas de Castro, que passava os mesmos filmes do circuito do Rio.

Hoje, a praça que no passado fervilhava, com seu futebol, feira livre, manifestações cívicas, blocos carnavalescos e bailes de carnaval, agora só enche de torcedores em dias de jogos do Vasco e do Flamengo.

Quando me lembro da vida social intensa do Barreto, com o Humaitá liderando em festas de casamentos, bodas e bailes; o CSSERJ, clube dos sargentos com seus bailes e domingueiras; o Cinco de Julho, focado na área esportiva, além do Byron, que era o clube Náutico, de todos o único que desapareceu.

A Viradouro foi o presente que o bairro ganhou com o barracão da escola de samba que veio de Santa Rosa levando para a Avenida do Contorno a alegria e o samba no pé, além de muitos títulos conquistados no carnaval carioca.

O clima de confraternização de moradores e ex-moradores é mantido há 60 anos pelo Grupo do Barreto. Não tem sede nem estatuto e se reúne em restaurantes da cidade brindando com a loura suada, como chamam a cerveja. Foi fundado pelo jornalista Hercílio Miranda, Barreto Filho, Joelson Gonçalves e mais 41 pessoas, a maioria operários. Resiste heroicamente com 23 componentes presididos pelo coronel Claudecir Ribeiro da Silva.

O bairro operário teve um sindicalismo forte com o Sindicato dos Metalúrgicos, que perdeu força com o golpe de 64. Mas a chama de luta se mantém viva com o Sindicato dos Operários Navais, na Rua Benjamin Constant.

Passa uma ambulância e lembro do Orêncio de Freitas, um hospital que a Prefeitura quer acabar, apesar de seu papel fundamental na área cirúrgica para aqueles que não têm planos de saúde, além de ser um formador de excelentes médicos espalhados por todo o Brasil. Foi construído no Morro dos Marítimos graças ao empenho de um operário naval que lhe empresta o nome.

Passo em frente a um lugar que me traz tristeza e saudade, onde os niteroienses sepultam seus entes queridos em um dos três cemitérios da Rua General Castrioto: o Santíssimo Sacramento, o da Irmandade Nossa Senhora da Conceição e o Maruí Grande que tem a capela de São Pedro construída em 1751.

Não poderia esquecer da minha saudosa amiga e mestra Maria José Cid, mulher educadíssima, que com muito sacrifício manteve o Colégio Nilo Peçanha com um quadro de excelentes professores, formando gerações de alunos para a vida. Tem história também a Escola Industrial Henrique Lage, que formou milhares de jovens profissionais de alto nível. Foi dirigido uma vida inteira pelo professor Álvaro Caetano.

Indústrias não faltaram no Barreto. Havia a fábrica de tecidos Manufatura que dava vida e cor ao bairro com lojistas, estilistas e costureiras em busca de novidades nas estamparias que iam compor e embelezar as peças de suas confecções. Ao passar por duas jovens estudantes fumando, minha memória se ilumina. Lembro de outra fábrica que já fechou, a dos fósforos Marca Olho, da Companhia Fiat Luz.

O Barreto é berço também de figuras impolutas, como o eclético Brígido Tinoco, que foi ministro da educação, prefeito de Niterói e de São Gonçalo, deputado federal, vereador, catedrático e diretor da Faculdade de Direito da UFF.

Outro que fez bonita história jurídica e maçônica, que começou a vida como vendedor de uma loja de móveis na Praça Enéas de Castro, foi Waldemar Zveiter. Um orador primoroso, foi cinco vezes Grão Mestre da Grande Loja Maçônica do Estado do Rio de Janeiro. Ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, em seguida desembargador do Estado do Rio de Janeiro, encerrou a brilhante carreira como ministro do Superior Tribunal de Justiça.

Na política da ex-capital fluminense, o Barreto tinha grande peso não apenas pelo seu eleitorado, como pelas figuras públicas que projetou. Além de Brígido Tinoco, o bairro elegeu o educador Alberto Fortes prefeito duas vezes, além de quatro vice-prefeitos que assumiram a Prefeitura: João Baptista da Costa Sobrinho, Armando Barcelos, Palmir Silva e o atual Paulo Bagueira.

Na música, o Barreto deu Sérgio Mendes, uma estrela da bossa nova que conquistou o mundo, começando a carreira no Petit Paris, em Icaraí. Seu pai, o médico Benedito Mendes, atendia de graça numa farmácia em frente à praça do Barreto.

Esse prestigiado pedaço de Niterói já teve até, durante bom tempo, uma estação de passageiros para a ligação marítima com a Praça XV, no Rio. Facilitava a vida dos moradores da Zona Norte e São Gonçalo, encurtando a viagem na época antes da ponte Rio-Niterói. Hoje transformado em bairro de passagem, o Barreto é um esburacado corredor viário entre São Gonçalo e o Centro de Niterói.

Gilson Monteiro

Iniciou em A Tribuna, dirigiu a sucursal dos Diários Associados no Estado do Rio, atuou no jornal e na rádio Fluminense; e durante 22 anos assinou uma coluna no Globo Niterói. Segue seu trabalho agora na Coluna Niterói de Verdade, contando com a colaboração de um grupo de profissionais de imprensa que amam e defendem a cidade em que vivem.

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