Uma pilha de livros jogada na rua chamava atenção de pessoas que passavam pela Rua Luiz Leopoldo Fernandes Pinheiro, no Centro de Niterói. Alguns passantes se indignavam com o que chamavam de “sujeira”, mas havia outros que procuravam entre os livros algum que interessasse. O autor da “obra”, além de cometer infração ao Código de Limpeza Urbana de Niterói (Lei 1212/93), atentou contra a cultura comparando livros a lixo.
Adroaldo Peixoto, dono da Livraria Panorama Romanceiro, há 52 anos, diz que as pessoas estão se desfazendo dos livros por vários motivos: porque estariam desatualizados; por mudança de endereço; e até por morte do dono da biblioteca. Na lista dos descartáveis veem-se as enciclopédias Barsa e Britânica, porque se tornou mais prática a consulta pela internet. E o descarte ilegal de livros vem-se repetindo em Niterói. Há poucos dias, um leitor do Ingá ligou para a Coluna reclamando que alguém enchera de livros usados uma caçamba de entulho que ele alugara para sua obra.
Em 2010, Adroaldo criou o projeto “Compartilhe Livros” com a finalidade de disponibilizá-los para bibliotecas comunitárias, de escolas e de faculdades públicas, já tendo doado mais de 36 mil livros. Agora está doando dois mil livros para o Presídio Feminino. Desde 2011, a remição da pena também se dá, além do tempo de trabalho na cadeia, pela leitura comprovada de livros.
– Nesses 12 anos de atividades do projeto, já doamos mais de 36 mil livros para bibliotecas do interior e até presídios. Poderíamos doar muito mais, não fosse a recusa das instituições. Lamentavelmente, hoje vemos com frequência livros em caçambas de lixo e até em aterros – lastima Adroaldo.
O “Compartilhe Livros” conta com 3.800 pessoas engajadas, mas segundo o livreiro vem tendo dificuldade para doar os livros, porque bibliotecas têm-se recusado a receber essa preciosa oferta. Alegam não ter funcionários para classificar as publicações por assunto, catalogá-las e colocá-las no lugar certo, além de alegarem falta de estantes suficientes.
Adroaldo Peixoto foi incentivado pelo avô Sebastião Peixoto para abrir a livraria. Na época, o livreiro era aluno do Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHF), da Universidade Federal Fluminense, onde também cursou Letras e Direito. Fundada em 1970 como a “Sebo Panorama”, logo a livraria de Adroaldo se tornou referência no comércio de livros novos, raros ou usados em Niterói e arredores.
– Com a confiança dos nossos clientes/leitores, passamos de uma pequena banca de livros na Universidade Federal Fluminense para uma livraria que vende para o mundo inteiro. Nossos livros usados são limpos e higienizados antes do envio. Reembolsamos valores pagos por livros cuja descrição eventualmente não corresponda ao desejado, após a devolução deles. Só não comercializamos livros do professor nem comercializamos xerox de livros – diz Adroaldo Peixoto.
Boa tarde. Penso que o descarte de livros deva obedecer a critérios bem definidos.
O que pode ser desatualizado para alguns, para outros, são de informações preciosas que não se encontram na Internet. Deveríamos ter, um serviço de restauração de livros, em que o cidadão poderia ter acesso e impediria o descarte de livros por não estarem em condições de serem manuseados.
Ola, tudo bem? Entendo a indignação com o descarte de livros. Mas trabalho em uma biblioteca e devo dizer: muitas vezes, as pessoas tentam nos doar qualquer coisa que tenham em casa e já não possui serventia. Temos dúzias de barsas doadas, livros infestados com fungos e revistas antigas. Isso não é material para biblioteca, porque biblioteca não é depósito de livros. Mas há ainda uma cultura de adorar o livro como objeto sagrado do saber e ver o descarte de obras como uma blasfêmia. O livro só tem sentido se utilizado e, para isso, os bibliotecários fazem avaliações sobre a pertinência de uma obra para o acervo. Se o livro já cumpriu seu ciclo de vida e está gasto ou, se após muito tempo nunca foi usado, o descarte é sim uma alternativa. E para isso, deve-se pensar em cooperativas de reciclagem e outros lugares que dêem um fim correto ao papel, não o descarte irregular de lixo como vemos na foto.
Fora a questão do desmonte da Educação e da Cultura, pois não temos mesmo recursos humanos e financeiros para aceitar doações indiscriminadamente. Então antes de doar, pensem qual o motivo para estarem doando. Querem só se livrar dos objetos e ficar com a consciência limpa? Será que o lugar desse livro é mesmo na biblioteca, que talvez nem trate sobre aquele assunto ou já tem mil exemplares disso? Será que reciclar é tão ruim assim? Bibliotecas são organismos em crescimento e precisam de coleções harmônicas e úteis para nossos leitores. Seja qual for o tipo de biblioteca (pública, universitária, comunitária, etc.), não somos depósito de livros.
As vezes a pessoa jogou fora dessa maneira por que cansou de procurar sebo ou biblioteca que aceitasse a doação. Um dos motivos da recusa pode ser o estado dos livros. É difícil ter livro em bom estado e por um valor que compense a compra em sebos. Se um lugar que vende livro está doando, é por que não serve para venda.
Comentário perfeito!
Concordo com o comentário da Bibliotecária. Tambem sou bibliotecária, e agora aposentada, sei bem o quanto é difícil que as doações sejam previamente discutidas com a direção das bibliotecas. Em alguns lugares, ruas existem locais para se deixar livtos empilhados para pessoas coletarem. Não se deve jogar na rua de qualquer jeito, como lixo. Aliás a prefeitura devia multar quem joga lixo na rua, sem estarem ensacados como na foto.
Eu cansei de ligar para escolas e bibliotecas oferecendo livros. Ninguém quer. Eu já fui em casa de um professor que não havia nem estante. Nada. Mas tento resolver de outra maneira. “Esqueço” um livro no ônibus, em banco de jardim, outro dia coloquei numa sacola e encostei junto ao pé de uma árvore. Quando passei na volta, já não estava lá. Muitas pessoas querem ler, mas livros são caros, Temos que fazê-los circular
Eu acho que deveria haver um lugar onde esses livros pudessem ser recolhidos e depois redistribuídos para bibliotecas que os quisessem. Há muitas bibliotecas querendo doações e muita gente doando livros para bibliotecas que não tem interesse naquele gênero literário. E outras querendo aqueles livros, mas, não estão no radar desses doadores.
parabéns Adroaldo pelo belo gesto
Caro jornalista Gilson Monteiro, não nos surpreende, lamentávelmemte , assistir esse descarte de livros nas caçambas e lixeiras. Tão triste também o desmonte do Ministério da Educação, a extinção do Ministério da Cultura e a implantação da política armamentista, onde se constata a substituição dos livros pelas armas, e a dolorosa situação de 30 milhões de irmãos brasileiros que passam fome. As bibliotecas até gostariam de receber nossas doações de livros, através do PROJETO COMPARTILHE LIVROS, porém a falta de bibliotecários e demais profissionais, os espaços cada vez menores tem contribuído para essa grave deficiência, entretanto nos últimos 10 anos apesar de tudo,com o esforço de nossos colaboradores e estagiários da UFF, que compõem nossa equipe, foram 36 milhões de livros compartilhados com bibliotecas comunitárias, bibliotecas do interior e bibliotecas nos presídios e aos jovens que se iniciam na formação do hábito de leitura. A Livraria Panorama, que nasceu no ICHF da UFF, hoje completando 50 anos, se orgulha, modestamente ,contribuir junto com outros colegas livreiros de Niterói, oferecendo livros e debates de ideias.
Parabéns Adroaldo Peixoto! Estou sempre na Panorama garimpando livros! Você muito colaborou com os meus filhos no tempo em que estudavam no ginásio e nas Faculdades.