
Quando vejo esse calor insuportável às vésperas do carnaval, com uma infinidade de blocos de rua por todo canto, uma multidão suada e grudada um no outro, lembro a diferença do tranquilo carnaval de Niterói, onde a Rua da Conceição era o grande point da alegria.
A movimentação carnavalesca começava no final da tarde sem hora para acabar. As famílias chegavam trazendo suas cadeiras e pequenos farnéis com bebidas, embora isso nem fosse necessário, pois as tradicionais casas de culinária estavam abertas para atender a clientela da folia.
A Imbatível Leiteria Brasil oferecia lanches e refeições para todos os gostos e idades; a Sportiva, com seus variados salgadinhos feitos na hora; a Italiana que servia pizzas em pedaços com um molho especial de suco por cima; e o Bar Municipal com seus tira-gostos diferenciados, de testículos de boi à milanesa a carnes de rã ao alho e óleo.
Na retaguarda, a Farmácia Ponciano contava com seu Acácio de prontidão para dar dicas para a cura das ressacas e, nos casos mais avançados, aplicar injeções nos braços ou nas nádegas. Quando a queixa era uma simples dor de cabeça, ele encaminhava para tomar Hidrolitol, uma água efervescente no Hidrovita, que também servia refrescos em frente à estação das barcas.
No meio de confetes, serpentinas e os mais afoitos cheirando lança-perfume, desfilavam crianças, mulheres, homens e muitos blocos com as mais variadas fantasias, originais ou de luxo, que, dependendo da performance, eram reverenciadas, com as pessoas se levantando das cadeiras para aplaudir de pé.
Vou lembrar um fato que aconteceu no carnaval e que eu relembrei recentemente com alguns doutores quando o prefeito Rodrigo Neves assinou o decreto permitindo que as pessoas trabalharem de bermudas. Tem determinados profissionais, como os médicos, que não podem largar os seus tradicionais jalecos brancos, principalmente quando atuam nos hospitais e postos de atendimento.
Conto a história do saudoso Carlos Augusto Bittencourt Silva, que, quando chefiava a emergência do Antônio Pedro e estava com quatro colegas de sarongue prontos para sair no desfile da tradicional Banda do Central, receberam um telefonema avisando que tinha acontecido um desastre com vários feridos. O Dr. Gugu, aquela figura especial e fora de série, para não perder tempo, pegou os quatro colegas e foram direto dali para a sala de atendimento do hospital para ver a gravidade e começar a prestar socorro.
Um dos atendidos, quando acordou, perguntou ao médico onde estava. A resposta foi que estava sendo atendido na emergência. “Ainda bem”, disse ele, “pensei que estava num baile de carnaval”.
No desfile do ano seguinte da Banda do Central, Gugu e os colegas desfilaram com seus jalecos, mas dessa vez em paz e alegres. Carlos Augusto Bittencourt Silva, médico, professor de ortopedia da UFF, vereador, ocupou várias funções públicas na área da saúde e foi um dos fundadores do primeiro hospital ortopédico de Niterói. Ele criou o Projeto Gugu de ginástica para a terceira idade, que é um sucesso na cidade.
O colunista tentou botar na rua este ano o “Bloco do Cacique”, em homenagem ao nosso Arariboia, mas teve pouca adesão. Senti que o pessoal neste carnaval está atrás de sombra e água fresca. Vamos torcer para que em 2026 a temperatura fique agradável e com bons ventos.