
A recente decisão da Câmara de Vereadores de Niterói, que autoriza a exploração comercial dos parklets (minipraças urbanas) por bares, restaurantes e estabelecimentos comerciais, marca um preocupante capítulo na gestão do espaço público da cidade. O que antes era pensado como um respiro urbano — um oásis de convivência em meio ao concreto — agora corre o risco de se tornar apenas mais uma extensão de bares e restaurantes, que vão poder cobrar taxa de consumo no asfalto.
A proposta aprovada ontem (25), em segunda discussão, tem a autoria de quatro vereadores que formam a base política do prefeito Rodrigo Neves. Seu líder no Legislativo, Binho Guimarães, e os vereadores Renato Cariello, Leandro Portugal e Rodrigo Farah, propuseram a alteração do artigo 104 da Lei Municipal 2.624/08 (Código de Posturas de Niterói) para permitir que estabelecimentos comerciais possam explorar economicamente os parklets que mantêm.
Em seu artigo primeiro, a lei que ainda vai à sanção do prefeito, estabelece: “Fica permitida a exploração econômica dos parklets por parte dos estabelecimentos comerciais mantenedores, permitindo seu uso para serviço de mesa e comercialização de produtos, desde que sejam respeitadas as normas estabelecidas em regulamento, bem como o regular recolhimento das taxas municipais aplicáveis.”
Consuma para sentar
A lógica é familiar aos niteroienses. Basta dar um passeio por praias como Charitas, Camboinhas, Itaipu ou Piratininga para observar como a faixa de areia foi, pouco a pouco, ocupada por barracas, cadeiras e sombreiros de uso quase exclusivo de quem consome. O espaço que deveria ser livre e acessível a todos passou a ser, em muitos trechos, um território do “consuma para sentar”.
Agora, essa dinâmica se desloca para o asfalto. Os parklets, concebidos como estruturas temporárias e gratuitas voltadas ao lazer e à convivência, estão sendo capturados por interesses privados sob o pretexto de revitalização econômica. A nova lei aprovada quarta-feira (25) concede aos estabelecimentos o direito de vender, atender e estender suas atividades comerciais nesses espaços — o que pode transformá-los em verdadeiros “puxadinhos” da iniciativa privada.
Em cidades como São Paulo, referência na implementação dos parklets, há regulamentações específicas para garantir que esses espaços sejam inclusivos e de uso irrestrito, mesmo quando apoiados financeiramente por empresas. Niterói, ao contrário, está agora institucionalizando a exclusão urbana: o que é público passa a ser consumível — desde que se esteja disposto a pagar.
Não se trata de negar o potencial positivo dessas estruturas para a vida urbana, mas de lembrar que o espaço público é um direito coletivo, não um privilégio condicionado ao consumo. Se há interesse em fomentar a economia local, que isso seja feito com criatividade, equidade e respeito à diversidade social da cidade. Do contrário, corremos o risco de ver a terra de Arariboia se tornar uma vitrine bonita, porém inacessível.