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Coluna do LAM

Europa adota bicicleta na pós-quarentena. Niterói avança para trás

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Em Paris, a prefeitura investe milhões porque a bicicleta é uma aliada na luta contra o coronavírus.

A Europa decidiu investir milhões de euros em ciclovias, oficinas, bicicletários e as vendas batem recordes. Indiscutivelmente o uso da bicicleta é o destaque nesse retorno à vida depois do confinamento porque garante o distanciamento social.

Se no berço da Civilização, prevalece a sensibilidade e inteligência dos gestores públicos em defesa da saúde dos cidadãos, que descobriram na bicicleta uma forte aliada para que se evite contágios de coronavírus nos transportes públicos, Niterói parece ter optado por andar para trás.

Em Niterói, a cidade voltou para o século 20, dominada pelos ônibus.

Segundo promessas do programa Niterói de Bicicleta, da prefeitura, criado e comandado pelo então vice prefeito Axel Grael em 2013, hoje a cidade contaria com uma malha de 100 quilômetros de ciclovias e ciclofaixas, mas não passou de 35 quilômetros. Depois da ciclovia da avenida Marques do Paraná nenhum outro projeto está sendo feito.

Para proteger a população do contágio nos transportes públicos a prefeitura de Paris liberou 22 milhões de euros (em torno de R$ 135 milhões) para a criação de ciclovias. Nesta primeira fase de abertura da quarentena na França, os parisienses vão poder usufruir de 650 quilômetros de ciclovias pela cidade.

Em Bruxelas, desde o início da semana, 40 quilômetros de faixas para carros e estacionamentos foram transformados em novas ciclovias nas principais vias da capital da Bélgica. Iniciativas semelhantes estão sendo criadas em Barcelona e Milão. Na Alemanha, o país dos automóveis, pedalar é um verbo cada vez mais conjugado em cidades como Berlim.

Niterói tinha tudo para tornar cidade referência nessa modalidade de transporte. Cidade média, basicamente plana, litorânea, a prefeitura fez um grande barulho para lançar o Niterói de Bicicleta, de fato uma boa sacada do atual secretário de planejamento Axel Grael, gestor do programa. Para dar o exemplo, na época ele próprio passou a usar bike para ir trabalhar, mas também desistiu.

A população acreditou, comprou ou reformou bicicletas e descobriu que ir para o trabalho pedalando, além de agradável faz bem a saúde. Combate a obesidade, derruba o mau colesterol, melhora a respiração, ajuda na pressão arterial, melhora a libido, ajuda no combate a ansiedade e depressão. O mercado também acreditou. Novas lojas foram abertas, oficinas especializadas criadas, empregos gerados.

Em 10 de novembro do ano passado, Ancelmo Gois publicou em sua coluna, no Globo: “Travessia Rio-Niterói: número de pessoas que usam bicicleta aumentou 525%”. E escreveu:

“Acredite. Em sete anos cresceu 525% o número de pessoas que usam a bicicleta no deslocamento diário entre Rio e Niteroí.

Vamos aos números: em 2013 as barcas transportavam uma média diária de 120 bicicletas na linha Arariboia (entre 7h e 12h). Atualmente, no mesmo período, a média é de 750 bicicletas.

Qual é a razão?

1) Tem mais gente pedalando em busca de uma vida saudável.

2) A oferta de ciclovias dos dois lados da baía aumentou.

3) É para fugir do engarramento dos dois lados da ponte.

4) Todas as respostas acima.”

O jornalista indagou e, claro, a resposta correta é a opção quatro.

Em um levantamento divulgado ano passado pelo coletivo Pedal Sonoro, a Avenida Roberto Silveira, em Icaraí, foi a via que apresentou o maior tráfego de ciclistas, totalizando 4.236 viagens por dia. Os números representam um aumento de 40,7% em relação ao ano passado e 290% se comparado ao ano de 2015. A contagem foi realizada no dia 10 de setembro pela Transporte Ativo, entre 7h e 20h.

Na Avenida Amaral Peixoto a contagem foi feita pelo Transporte Ativo em 11 de setembro, entre 7h e 20h. Foram registradas 3.449 viagens por dia, apontando um crescimento de 33,8% em relação à 2018 e 291,9% se comparado à 2015.

O Pedal Sonoro diz que “os números levantados por estas contagens respaldam, sem sombra de dúvidas, nossas cobranças para que a gestão municipal adote uma política cicloviária séria, a fim de garantir o conforto e a segurança para milhares de cidadãos e cidadãs que optaram por utilizar a bicicleta como meio de transporte na cidade. Se a demanda existe, o que a Prefeitura de Niterói está esperando?”

Durante esta quarentena da pandemia o número de bicicletas disparou na cidade, apesar do perigo. Centenas de entregadores conseguem sobreviver fazendo delivery de bicicleta pela cidade, apesar do perigo porque são poucas as opções de segurança já que o programa Niterói de Bicicleta está parado.

“Parou porque as empresas de ônibus mandaram. Não estão gostando da quantidade de pessoas que deixaram de pagar passagens optando pela bicicleta”, opinou o vereador Paulo Eduardo Gomes (PSOL) em entrevista a Rádio Pedal Sonoro, no final de 2019. “Qualquer ação que contraria esse jogo de interesses é abortada”, disse.

Guilherme Moyses Pfeffer é colaborador do site Mobilize (Mobilidade Urbana Sustentável), que ouviu 100 moradores da cidade para seu trabalho de conclusão do curso de engenharia pela Universidade Federal Fluminense.

Segundo o seu extenso e brilhante trabalho, publicado pelo site em agosto de 2018, “das respostas, chama a atenção o fator considerado mais relevante para o uso da bicicleta para a maioria dos entrevistados: o sentimento de segurança. A falta de segurança se dá principalmente na relação com outros modais de transporte – para os entrevistados, os motoristas não respeitam ciclista – e ainda na precariedade da infraestrutura cicloviária. O item ‘falta de segurança’ recebeu nota 4,63 (numa escala de 0 a 5).

De acordo com Pfeffer “no seu dia a dia, 48% dos entrevistados responderam usar a bicicleta para se locomover. O que remete a outro resultado bastante importante desta pesquisa: a percepção dos ciclistas sobre o trânsito. Para 70% dos moradores, o maior desafio enfrentado por quem pedala no dia a dia é a violência no trânsito, evidenciada no desrespeito dos outros modais de transporte em relação à bicicleta.

Niterói perdeu uma chance de ouro de fazer bonito.

Luiz Antonio Mello

Jornalista, radialista e escritor, fundador da rádio Fluminense FM (A Maldita). Trabalhou na Rádio e no Jornal do Brasil, no Pasquim, Movimento, Estadão e O Fluminense, além das rádios Manchete e Band News. É consultor e produtor da Rádio Cult FM. Profissional eclético e autor de vários livros sobre a história do rádio e do rock and roll.

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