Há cem anos, o esgoto era recolhido do mesmo jeito que hoje, no século XXI, ainda se faz com o lixo. Antes eram carroças puxadas a burro transportando barricas cheias de fezes. Hoje são caminhões basculantes que poluem as ruas de Niterói largando um rastro de mau cheiro, tal e qual no tempo do Antonico da Titica, dono da Empresa de Remoção de Matérias Fecais, que despejava na Ponta da Armação os dejetos recolhidos nas casas da cidade.
Assim como o esgoto, que é coletado dos prédios e transportado por redes subterrâneas até estações de tratamento, o lixo urbano poderia ter sistema idêntico ao que Barcelona, na Espanha, começou a implantar antes das Olimpíadas de 1992, que sediou.
A uma profundidade de cinco metros, o lixo de casas, escritórios e até hospitais da capital catalã é aspirado de hora em hora, diuturnamente, e os sacos são transportados por meio de 113 quilômetros de tubulação a uma velocidade de 70 quilômetros por hora embaixo da terra.
O destino final é um centro de coleta, geralmente instalado na periferia da cidade. O lixo entra diretamente em um container, que depois de cheio é transportado para uma usina de triagem, ainda mais afastada da cidade. Plásticos, latas e papel são reciclados. O lixo orgânico vira combustível para mover turbinas que produzem eletricidade.
Em Barcelona, os apartamentos construídos nos últimos 15 anos já têm o sistema de coleta de lixo instalado internamente. Os moradores não precisam levar os sacos até a rua: 70% do lixo na capital da Catalunha já são recolhidos assim. E, em breve, Barcelona inteira não terá mais nenhum caminhão de coleta de lixo circulando pela cidade.
Cem anos atrás, Niterói não tinha rede de esgoto. O primeiro prefeito da cidade, Paulo Alves, nomeado em janeiro de 1904, mandou que as carroças de Antonico da Titica, como era conhecido Antonio Ferreira de Oliveira, dono da empresa de remoção, fossem bem lavadas em uma bica na Ponte de Despejos, na Ponta da Armação, para não exalarem mau cheiro por onde passavam.
Ao mesmo tempo, o primeiro prefeito da cidade, que também foi o primeiro a falar em proteção ao meio ambiente, tentava levar adiante a implantação de uma rede de esgotos na cidade. Isto somente começou a ser feito em 1912, pelo prefeito Feliciano Sodré.
Mas Paulo Alves, que comandou a prefeitura de janeiro a novembro de 1904, conseguiu lançar as sementes para a criação de um serviço de limpeza domiciliar, instituiu o Serviço de Arborização e baixou lei condenando a derrubada de árvores feita, então, em quase todas as praças e ruas da cidade.
O primeiro projeto da rede de esgotos foi do engenheiro Jorde Valdetaro de Lóssio Seiblitz, professor de arquitetura e saneamento da Escola Politécnica. Previa o tratamento microbiológico dos dejetos e seu despejo através de emissários oceânicos. Em 1912 ele reviu e atualizou o projeto. Somente em 2005, Niterói passou a ter coleta e tratamento de esgoto em 90% do município.
Para a organização do Serviço de Limpeza Pública e aquisição de equipamentos para a incineração do lixo urbano, Paulo Alves pediu autorização à Câmara para a prefeitura contrair empréstimo. Na época, a solução era queimar o lixo. Não havia preocupação com reciclagem ou os estragos que a fumaça trazia ao ambiente. Mas em 1904 a questão não se resolveu, tanto que em agosto o prefeito declarou caduco o contrato firmado com Nereu Rangel Pestana e Emilio Pires Machado Portela em 6 de fevereiro de 1902, para a implantação de uma usina de incineração de lixo.
Enquanto Niterói continuar como no tempo do Antonico, com a Clin ou prepostos no serviço de coleta domiciliar percorrendo as ruas espalhando mau cheiro, com os caminhões engarrafando o trânsito e o lixo sendo amontoado pelos moradores nas esquinas à espera deles, os bairros continuarão sujeitos a sofrer alagamentos quando chove mais forte, pois os sacos boiam e entopem bueiros.
Assim, a cidade tida como de boa qualidade de vida, primeira em renda média per capita do Estado e outros títulos mais, continuará distante do século XXI em termos de saneamento e de serviços básicos de limpeza urbana.
Nada mais revoltante é ver os funcionários sendo transportados naquela boléia traseira quando se dirigem aos lixões ao final do recolhimento, seja no sol ou na chuva! . Não vejo nenhuma voz ativista a reclamar dessa falta de respeito com esses trabalhadores que executam uma atividade insalubre e não recebem o devido respeito por parte dos gestores e também dos representantes do Ministério Público do Trabalho que ainda permitem tal fato. Agora, pedir a transferência de criminosos de alta periculosidade sempre aparece alguém disposto a acolher.