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Coluna do LAM

Caminhando pelas ruas de Niterói

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Caminhando pelas ruas de Niterói, noto que é errado afirmar “todo ano jogo meu IPTU no esgoto”. Nem no esgoto nossos impostos estão porque o que mais sentimos nas ruas, vielas, avenidas da cidade está simbolizado pelo cheiro de urina e fezes, humanas e também de cachorros, cujos donos, primitivos radicais, levam para passear sem recolher os dejetos. Tempos atrás lavavam as ruas (alguém lembra?), mas hoje quase não vemos, sequer, garis. Se os cachorros levassem seus donos na coleira, esse fenômeno não aconteceria.

Caminhando pelas ruas de Niterói reparo a multiplicação bizarra de marginais fantasiados de flanelinhas, achacando motoristas apavorados nas ruas internas de São Francisco e Icaraí. Alguns batem no peito, orgulhosos (na verdade ameaçando) dizendo que vieram de um complexo qualquer, aquela tragédia urbana que existe no Rio. Os marginais agem livremente porque, afinal, a culpa não é de quem faz, mas de quem deixa fazer. Desde Adão e Eva é assim.

Caminhando pelas ruas de Niterói reparo que não encontro mais amigos ou conhecidos da adolescência, ou mesmo dos anos 1980/ 90. A maioria fugiu da cidade. Muitos moram em São Paulo, outros no Rio, vários foram para o interior para suposto alívio daqueles que querem, mesmo, que os incomodados se mudem.

Caminhando pelas ruas de Niterói vejo que a areia da Praia de Icaraí foi privatizada e loteada por academias de ginástica (oficiais e clandestinas) que faturam alto dando aulas (pagas) para pessoas de várias idades, utilizando um espaço público, reduzido a quase nada. Muita gente reclamou (e reclama), mas o governo nada fez, faz ou fará. Por que? Não sei.

Caminhando pelas ruas de Niterói noto que a quantidade de moradores de rua atingiu níveis astronômicos. Famílias inteiras fazem suas necessidades e dormem nas calçadas a qualquer hora do dia e da noite. Abordam (muitas vezes de forma violenta) os cansados, suados, revoltados cidadãos exigindo dinheiro, como se os habitantes de Niterói tivessem que pagar multa pelo abandono deles.

Caminhando pelas ruas de Niterói observo que os quiosques no calçadão da Praia de Icaraí viraram restaurantes pé sujo, com várias mesas e cadeiras espalhadas pela calçada que, em tese, é pública. O poder público, em tese, deveria resgatar devolver áreas públicas ocupadas ilegalmente aos cidadãos. Ou não?

Caminhando pelas ruas de Niterói observo que a Praia de Itaipu se transformou mesmo em um esculacho urbanístico à beira mar do Brasil. Havia um projeto de reurbanização daquilo que um dia foi uma bucólica aldeia de pescadores. Que fim levou o tal projeto? Onde foi parar? Por que não foi executado? Até quando aquele quase balneário transformado lixo urbanístico vai agonizar no lodaçal da decadência?

Caminhando pelas ruas de Niterói, sinto que a população está indignada com a poluição. De fato, em bairros como Icaraí, Ingá, São Francisco, Santa Rosa, as ruas foram tomadas por kombis que migram de outras cidades para catarem ferro velho aqui. Um dirige e o colega, no banco do carona, importuna todo mundo usando um alto falante vendendo ovos, legumes. Por falta de fiscalização, vans, caminhões e ônibus formam uma verdadeira esquadrilha da fumaça empesteando toda a cidade. Tempos atrás, o poder público realizava blitzes em vários lugares medindo as emissões de fumaça dos veículos. Hoje? Nada.

Caminhando pelas ruas de Niterói, não reconheço mais nada. Moro nessa cidade desde os anos 1960 e hoje concordo com meu saudoso amigo Jorge Alberto Xavier (o célebre Jajá), jornalista de ponta (foi correspondente do Estadão no Vietnã) que escreveu uma sensacional matéria de duas páginas no jornal LIG, em 1976. Título: “Só a terceira guerra mundial pode salvar Icaraí da especulação imobiliária”. Na matéria, Jajá lembrava que só uma implosão em massa livraria a cidade dos prédios que proliferaram com a primeira onda da nefasta especulação imobiliária, que transformou a praia de Icaraí e ruas como a Moreira Cesar, em muralhas de espigões. Xavier foi ameaçado de morte, mas não arredou o pé daqui. Nos anos 80, por livre e espontânea vontade, foi viver em Minas. Acabou poupado de ver a Niterói de hoje, que não livrou a cara sequer de Charitas, também tomada de monstros arquitetônicos. Boatos dizem que a hora de São Francisco ir para o abate vai chegar em breve.

Caminhando pelas ruas de Niterói pensei em me mudar daqui. Cabeça quente. Avaliei melhor e decidi ficar. Caminhando pelas ruas de Niterói decidi continuar a caminhar pelas ruas de Niterói, que é a NOSSA cidade. E não a cidade deles.

Luiz Antonio Mello

Jornalista, radialista e escritor, fundador da rádio Fluminense FM (A Maldita). Trabalhou na Rádio e no Jornal do Brasil, no Pasquim, Movimento, Estadão e O Fluminense, além das rádios Manchete e Band News. É consultor e produtor da Rádio Cult FM. Profissional eclético e autor de vários livros sobre a história do rádio e do rock and roll.

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