As reações contrárias à palestra que o deputado federal Jair Bolsonaro vai fazer sobre segurança pública, sexta (27/05), às 19h, no Clube Português de Niterói, já provocaram arrependimento do presidente da agremiação lusa. Fernando Guedes disse que “em um país democrático, cada um tem o direito de falar o que quer, responsabilizando-se por isso”. Acrescentou, porém, que se soubesse antes que o encontro causaria tanta polêmica “teria preferido perder os R$ 12 mil do aluguel do salão”.
O presidente da OAB RJ, Felipe Santa Cruz, enviou um ofício ao Clube Português, pedindo o cancelamento do evento, alegando ser inadmissível dar espaço para um deputado que faz apologia à tortura. O advogado, ainda aos dois anos de idade, conheceu a face mais cruel do regime militar. Em 1974, seu pai Fernando foi preso por agentes do DOI-Codi no Rio e passou a fazer parte da lista dos desaparecidos políticos.
Pelo Facebook, um grupo de manifestantes pretende repetir na porta do clube, na Rua Lara Vilela, no Ingá, o “beijaço” que artistas promoveram em Brasília na Comissão de Cultura da Câmara em protesto contra Bolsonaro e o deputado Marco Feliciano.
O comando do 12° Batalhão da Polícia Militar fez contato nesta quarta-feira com o clube para informar que vai reforçar o policiamento na área.
O salão foi alugado por Carlos Jordy de Mattos Jr, funcionário da Agência Nacional de Transportes Aquaviários desde 2014, em Brasília. Ele é pré-candidato a vereador pelo PSC em Niterói.
Caro Gilson, é muito triste ver os intolerantes de esquerda e ativistas agirem como os camisas marrons fascistas impedindo um politico de falar! Temos nomes de assassinos em postos de saude e bandidos em escolas além de exaltações a terroristas confessos. Porque não posso ouvir o que este senhor tem a dizer? Porque não posso formar opinião ouvindo contraditorios? Nazistas usaram as mesmas técnicas intimidatorias!
Ainda dizem que vivemos em uma democracia, um Dep. Federal não pode dar sua opinião, pois a esquerda simplesmente não que deixar.
Devo informa que farei de tudo para esta presente, pois, é recebendo informações e que acabamos tendo nossa formação.
Essa dita esquerda é retrocado e fora de proposito que impor suas vontade.
Segue carta de repúdio assinada por mais de 100 pessoas e entidades e protocolada hoje no Clube Português.
Carta de repúdio ao Clube Português de Niterói
Nós, educadores, artistas, intelectuais, profissionais liberais, trabalhadores das mais diferentes classes sociais e estudantes, vimos, através desta carta, registrar nosso total repúdio à realização da palestra de Jair Messias Bolsonaro nas dependências do tradicional Clube Português de Niterói. Niterói, cuja história bonita de resistência contra o autoritarismo e a tirania lhe deu o título de “invicta”, não pode compactuar nem dar espaço, mínimo que seja, para uma fala anti-humanista, que publicamente atinge a negros, pobres, mulheres, homossexuais.
Julgamos impróprio que uma instituição de prestígio dê guarida a quem acaba de ser denunciado ao Tribunal Penal Internacional de Haia, por discurso a favor da ditadura e da tortura. A quem a OAB-RJ manifestou pedir cassação de mandato junto ao STF e ao Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, e até junto à Corte Interamericana de Direitos Humanos (OEA), se necessário. A quem já foi processado pelo MPF por espalhar ofensas em 2014, e agora tem nova possibilidade de denúncia do mesmo MPF, por sua homenagem a um torturador, conforme ocorreu na sessão de 17 de abril de 2016, na Câmara dos Deputados. A quem foi condenado no ano passado a pagar danos morais de 150 mil ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos do TJRJ, por abuso ao direito de liberdade de expressão. “Não se pode deliberadamente agredir e humilhar, ignorando-se os princípios da igualdade e isonomia, com base na invocação à liberdade de expressão”, registra-se na sentença da Juíza da 6ª Vara Cível do RJ. Por isso, nosso protesto.
Falamos do lugar legítimo que ocupamos, como cidadãos e amigos de Niterói, que não conseguem compreender o acolhimento de tal iniciativa por parte do Clube Português. Falamos do lugar de descendentes de portugueses, apaixonados pela cultura, pela história e pela literatura de Portugal. Por isso, a nossa grita contra a inadmissível anuência do Clube Português ao discurso de Bolsonaro, ao não se manifestar oficialmente sobre as mais de 170 publicações sobre o evento em sua página no facebook. Que recado quer passar com isso? Que é bem-vindo quem diga que “o erro da ditadura foi torturar e não matar”? Que “seria incapaz de amar um filho homossexual”? Que “ter filho gay é falta de porrada”? Que o aumento do número de gays se deve ao fato de a mulher trabalhar fora? Que “mulher deve ganhar salário menor porque engravida”? Quem diga que não estupra uma deputada “porque ela não merece”? Que “a PM deveria ter matado 1000 e não 111 presos no Carandiru”?
É notório que tal discurso vai contra os princípios do Estado democrático de direito, recente conquista no palco de nossa história política. Sim, Jair Bolsonaro jamais será recebido sem protesto e indignação aqui, em Niterói. A invicta. Não queremos crer que haja, entre os membros do Clube Português ou de sua diretoria, quem aprove qualquer regime antidemocrático, que tanto mal fez aos portugueses e brasileiros.
Por isso, nos cabe repudiar a postura autoritária de quem não reconhece em seu discurso a dignidade de todas as pessoas e a democracia como lugar da pluralidade. Tal acolhida causa-nos espanto, porque o Clube representa a colônia portuguesa, emigrada de um país empobrecido e assolado pela ditadura e pela guerra colonial. E é pela memória dos que lutaram por um país melhor para todos, aqui e em Portugal, que nos reunimos em repúdio à presença de Bolsonaro, que jamais será recebido sem protesto e indignação nesta invicta cidade de Niterói.
Esperamos, destarte, que essa decisão seja revista, para que se não macule a história de bons serviços prestados à sociedade e a boa imagem do Clube Português, como casa que em Niterói representa Portugal.