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Obra traz à lembrança tempo em que se comia cobra em Niterói

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A obra prevê a construção de um largo, em formato de rotatória, na Rua Mem de Sá

Quando passei nesta quarta-feira (14) pela Miguel de Frias com Mem de Sá, em Icaraí, minha memória tomou um susto. A prefeitura mandou demolir um prédio que guardava histórias de uma época em que se comia cobra em Niterói. A obra que está custando R$ 5,5 milhões ao município é, segundo a prefeitura, para a instalação de uma rotatória a fim de organizar o trânsito naquele cruzamento movimentado.

Consultando meus alfarrábios, relembrei do tempo em que boêmios e ecologistas travaram uma batalha gastronômica naquela esquina. Os primeiros adoravam o filé de jiboia como tira-gosto, até que os outros conseguiram mobilizar o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), que proibiu o Bar Cobreloa (demolido ontem) de vender as iguarias com carne de cobra e até de jacaré.

O filé de jiboia e a carne de jacaré cozida eram dois pratos que atraiam a freguesia de pratos exóticos. Vinha gente do Rio e de São Gonçalo, e às sextas-feiras, das 8h às 22h, o Cobreloa vendia, em média, dez quilos dessas carnes especiais.

Nos meus arquivos verifico que a carne de serpente era vendida ao bar por um fazendeiro de Silva Jardim. Ele criava as jiboias e também se encarregava do abate e da limpeza da carne antes de entregá-la ao Cobreloa. Já a carne de jacaré os donos do bar nunca revelaram sua procedência, provavelmente seria de algum alagado daqui de Niterói, mesmo.

Nos anos 80, o Cobreloa passou a fazer tanto sucesso, lotar e virar notícia na imprensa chamando a atenção dos ecologistas. Estes abriram a boca e atraíram ao bar fiscais do Ibama. Em meados de 1988, a casa foi proibida de servir aquelas duas carnes. O bar, no entanto, continuou servindo outras atrações culinárias. O testículo de boi, a carne de rã à milanesa, o pé de porco, a dobradinha com feijão e uma infinidade de tira-gostos foram mantidos no cardápio.

Do outro lado, “desquite” era atração

Do outro lado da Rua Mem de Sá funcionava o Orquídea, bar com nome de flor, que tinha uma varanda grande e amplo balcão. A casa ficou famosa por servir uma batida de limão que a clientela chamava de “desquite”. Isto porque as mulheres tinham ciúmes dos maridos que ficavam mais tempo naquele bar do que em casa. Eram atraídos pelo “limão” preparado com esmero pelo Ney, por três décadas pilotando a coqueteleira.

Ney não gostava de revelar seu segredo, mas um dia acabou contando a um repórter como fazia a tão apreciada batida de limão do Orquídea: “Corta-se ao meio um limão de casca fina e mistura cachaça, açúcar e gin. O segredo está em usar colher de pau para mexer a batida, além de um bom espremedor para extrair o sumo do limão”.

O Orquídea tinha uma enorme clientela de boêmios porque fechava às cinco da matina, mas abria duas horas depois para servir média com pão e manteiga. Nas noites de sábado, vendia 20 litros de batidas de limão nas mesas e nos balcões e 15 litros para viagem.

Só na terra do cacique Arariboia poderiam ter existido o Cobreloa e o Orquídea, dois bares que, por décadas, foram templos da boemia e da alegria de muita gente.

Gilson Monteiro

Iniciou em A Tribuna, dirigiu a sucursal dos Diários Associados no Estado do Rio, atuou no jornal e na rádio Fluminense; e durante 22 anos assinou uma coluna no Globo Niterói. Segue seu trabalho agora na Coluna Niterói de Verdade, contando com a colaboração de um grupo de profissionais de imprensa que amam e defendem a cidade em que vivem.

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