Voltando aos 13 anos, enquanto esperava boas ondas, de preferência bem altas e quebrando devagar, fazia meus planos. Faria um curso intensivo e totalmente empírico de surf com o amigo Jiló (um dos melhores do Brasil), terminaria o ensino médio e cairia dentro nos campeonatos, do Brasil e do mundo para décadas depois aposentar a prancha e ir viver na Califórnia.
Certo de que surfaria bem (não fazia feio encarando ondas de peito) no futuro rodaria pelo planeta em busca de ondas e de uma situação financeira que pudesse me manter na boa, sem sufoco. Não tinha ideia, naquela manhã meio fria, que um dia o surfboard se tornaria uma indústria milionária, cheia de patrocínios e grandes oportunidades, coaching, informática de ponta.
O plano ficou me martelando aquele ano. De fato eu queria ser um surfista e a única pessoa que sabia disso era meu saudoso tio Evaldo, irmão do meio minha mãe (o mais velho era tio Carlinhos Gallo de Freitas), com quem eu compartilhava minhas dúvidas, angústias, ansiedades de adolescente. Sentei com ele num bar em São Francisco e expus minhas ideias. Liberal, cabeça boa, democrata, tio Evaldo me deu a maior força mas garantiu que, lamentavelmente, meu plano não daria certo. Por que? Porque surfar era caro, muito caro e eu não teria condições de arranjar bons patrocinadores porque, quisesse ou não, era um principiante, num “país atrasado que acha que surfista é vagabundo”.
Nos dias de hoje, meu tio Evaldo seria a pessoa ideal para abrigar meu verbo, minha fala. Provavelmente iríamos para um bar em São Francisco onde eu me abriria e ele, jeitão super gentil, a certa altura da conversa iria dizer “chore, meu sobrinho, pode chorar…ninguém está olhando”. Ele tinha esse faro. O faro dos generosos, dos solidários, o faro das pessoas que só vivem felizes quando os outros também estão. O faro dos sonhadores que não só acreditam, mas que efetivamente dão duro para que isso aqui fique melhor, menos sonso, menos cínico, menos boçal.
Tio Evaldo não praticava o hediondo marketing do bom mocismo, da falsa solidariedade piegas, a micro burguesa dos canalhocratas e mergulhava fundo em busca de soluções para os dramas dos amigos, muitos deles artistas da bossa nova e da Tropicália, outros altos executivos de multinacionais, alguns boêmios bêbados. Meu tio foi a única pessoa que não se chocou ao ver debaixo de meu braço “Uivo”, de Allen Ginsberg, manifesto beatnik, com todos os sons, absintos e drogas inclusos, que era sim um movimento anárquico e com fortes inclinações comunistas, num tempo em que a ditadura no Brasil, por achar que comunistas comiam criancinhas, torturaram e matavam os militantes nos porões. Que bobagem. A abertura política mostrou que os comunistas brasileiros são uns merdas, canalhocratas indolentes, larápios mamando nas tetas do poder, vendilhões medíocres, incapazes de saber o que foi “Uivo”, o que foi Ginsberg, o que foi meu tio Evaldo.
Voltando ao surfboard concordei com meu tio, banhado de frustração. Tanto que cancelei o curso com Jiló. Melhor não saber surfar do que aprender e não poder me dedicar 24 horas por dia. Agradeci ao meu tio por mais aquela demonstração de paciência e fui embora para casa. Ele quis me dar uma carona de carro, mas eu precisava caminhar. E foi o que fiz.
Voltei a estudar. A princípio faria medicina e fui parar no Curso Miguel Couto, Centro do Rio, onde conheci grandes figuras de quem me tornei amigo, entre eles um que era um irmão, hoje grande médico Guilherme Pinto Bravo que a roda gigante da vida nos mantém distantes, mas que quando nos reencontrarmos vai ser tipo “parece que foi ontem”. Outro amigo de cursinho, hoje meu clínico geral, é uma fera chamada Ivan Schumann Marques Martins. Fiz vestibular e, como era de se esperar (não me entendi com a química inorgânica e nem ela comigo) levei bomba. Fiz outro para Comunicação e passei em oitavo lugar. O futuro médico foi estudar jornalismo.
Mas toda a vez que o mar ficava grosso eu ia ver os caras surfarem. Não perdia uma ressaca. Rio, Niterói, Itaúna (Saquarema) eu vivia entre os surfistas sem saber surfar por razões que já expliquei. Na faculdade decidi que seria dono de uma revista de surf, de preferência internacional, e cheguei a conversar com um colega que me convidou para fazer uma revista sobre ciência. Até fizemos e ficou boa. Mas os donos se desentenderam e rolou até tiroteio num velho sobrado da rua Visconde de Rio Branco, Praça Tiradentes, Rio, onde funcionava a redação. Corremos tanto que não voltamos até hoje. Foi a primeira vez que saltei para dentro da barca pela “boca” da frente depois dela ter largado o cais. Por pouco não fui homem ao mar.
Esse cara da revista de ciência me disse que eu só conseguiria fazer uma revista de surf se dominasse completamente o inglês e a área comercial (vender anúncios). E, com razão, o Brasil ainda não era um bom mercado por causa do estigma “surfista é tudo vagabundo”. Decidi virar plateia eterna do surfboard e partir para uma vida profissional viável, concreta, como, graças a Deus, consegui.
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