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Boechat, o amigo de todas as horas

Escrito por Gilson Monteiro às 15:18 do dia 12 de fevereiro de 2019
Sobre: De Niterói para o mundo
12fev

Boechat menino, na praia de São Francisco; e com amigos numa das indispensáveis peladas

Ricardo Boechat era um ser humano tão grande, tão completo, que não haverá espaço suficiente para escrever sobre ele nas próximas décadas. Sua morte repentina me abalou tanto, que resolvo aqui rememorar meu convívio com essa pessoa extraordinária. Não vou falar do jornalista, noticiado pormenorizadamente pela imprensa nacional e estrangeira. Vou focalizar o homem de uma simplicidade franciscana, que gostava de estar perto das pessoas humildes, que não se impressionava com o poder, que não tinha medo de nada nem de ninguém.

Já no ensino médio no Centro Educacional de Niterói ele começava a se destacar e a diretora Myrtes Wenzel profetizava: “Esse Boechat vai longe!”

Morava numa casa pequena de madeira, em São Francisco, onde nasceram seus três primeiros filhos. Depois, teve mais três em dois casamentos. Só gostava de carro grande e velho para carregar a filharada nos fins de semana até um sítio que tinha na subida da serra de Teresópolis.

Muitas vezes fui socorre-lo com uma chupeta elétrica, porque o carro estava enguiçado com a bateria descarregada; ou levava até onde estava um borracheiro para reparar pneus, porque seu carro não tinha estepe.

O que gostava mesmo era de jogar peladas, nas areias de São Francisco ou em campinhos de futebol no Rio, que só interrompia quando alguém gritava: “Boechat tenho uma notícia quente para você”.

Certo dia me levou para jantar no Castelo da Lagoa. O dono, Chico Recarey, para agradar mandou servir escargot de entrada. Era novidade para nós dois. Foi uma tragédia. Quando colocávamos o talher naqueles caracóis, eles pulavam do prato. Boechat, rindo, disse: “Chico, muito obrigado, isso não é prato para gente da tribo de Arariboia, lá nós estamos acostumados a comer feijão com arroz”.

Foi ele quem me levou para O Globo. Por isso, quando Boaechat saiu do jornal, preparei um jantar surpresa, cozinhando eu mesmo em sua casa no Leblon, para reunir um grupo solidário com o querido amigo.

Com a sua saída do sistema Globo, no auge da carreira, ninguém acreditava que ele sobreviveria a tamanho baque.

Só mesmo Boechat, com seu talento, sedução, coragem, garra, incrível poder de comunicação, para dar a volta por cima e ficar mais forte do que antes, caso inédito no jornalismo brasileiro. Na Band News se tornou líder de audiência do rádio no Brasil por todos esses anos, além da credibilidade que passava no jornal da TV Bandeirantes.

Há 17 anos quando tive uma doença grave, Boechat apareceu lá em casa e me levou ao grande médico Gilberto Salgado, responsável por minha cura. Antes, cuidou de minha cirurgia na Casa de Saúde São José, usando todo o seu prestígio para que eu tivesse, como tive, um atendimento digno e de primeira linha.

Guardo muitos bilhetes do saudoso irmão, dentre eles, separei dois: “Ao querido Gilson, um amigo tão raro, quanto o hotel de que trata este livro”. É que a fila do lançamento do livro “Copacabana Palace,” de sua autoria, estava tão grande, que resolvi pegar depois o autógrafo dele no Jornal do Brasil.

Mais adiante, sem lembrar que eu já havia recebido um exemplar, me mandou outro com um bilhete:

“Querido Gilson,

É vergonhoso amigos como nós se verem e se falarem tão pouco.

Até o livro do Copa, autografado à época, está desde 1998/9 esperando para ser entregue.

Lá vai ele, com saudades, Boechat”.

Filho excepcional, que o diga dona Mercedes, pai amantíssimo e dedicado, irmão incondicional, marido amoroso, companheiro solidário, amigo em todas as horas, deixa todas essas qualidades, difíceis de serem encontradas nesse mundo, onde o celular é a coisa mais importante.

Numa das peladas de futebol que não perdia por nada, Boechat machucou a perna e eu levei a sua casa o ortopedista Ledio Maia. Quando o médico disse que precisava levá-lo ao Hospital São Lucas, para tirar um Raios X, com seu bom humor habitual retrucou: “Doutor, jornalista não pode ser engessado, ainda mais em época de revolução”. O médico mandou colocar apenas uma atadura e ficou tudo certo.

Quando nos encontrávamos em qualquer lugar ele soltava o bordão :

“Gilson Monteiro, de Niterói para o mundo inteiro”.

Boechat, eu fiquei no território fluminense, mas ao irmão que se projetou nacional e internacionalmente, digo agora no seu adeus:

Ricardo Boechat de Niterói para o mundo!

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Gilson Monteiro
Iniciou em A Tribuna, dirigiu a sucursal dos Diários Associados no Estado do Rio, atuou no jornal e na rádio Fluminense; e durante 22 anos assinou uma coluna no Globo Niterói. Segue seu trabalho agora na Coluna Niterói de Verdade, contando com a colaboração de um grupo de profissionais de imprensa que amam e defendem a cidade em que vivem.
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28 thoughts on “Boechat, o amigo de todas as horas

  1. Amigo Gilson, parabéns pelo belíssimo exemplo de verdade amizade, leal, fraterna, desenteressada e imortal..abs

    1. Querido Gilson, fico com o coração massageado ao ler as suas palavras. Como é bom ver pessoas, colegas, homenageando outros colegas, amigo. Não precisava que Boechat fosse agora. Certa vez, no carro, sozinho, após ouvir um de seus comentários ácidos pensei, imagina o que ele vai falar quando tiver uns 80 anos. Por várias pensei em escrever para a direção da Band e pedir que a conversa matinal com José Simões fosse pelo menos de 30 minutos. podia começar com uma pauta programada. Mas, depois, eles ficariam falando qualquer coisa. Pois, sem dúvidas, para mim, pelo menos, era a melhor coisa que ouvia durante o dia.Obrigado Gilson, por nis ajudar a gostar, ainda mais, de Ricardo Boechat. Um beijo.

  2. Boechat é uma dessas pessoas que passa pela vida de uma forma muito especial e de maneira mais natural possível.Tentar defini-lo é se lembrar de alegria, coragem, generosidade, inteligência, humildade, parceria, respeito, responsabilidade, amor e bom humor. Sem dúvida nenhuma, é um ídolo, um ícone para o país.

  3. Excelente homenagem ao jornalista, que apesar de não ter nascido em Niterói, foi um dos maiores divulgadores de nossa cidade. Sugiro que inicie uma campanha para que o nome do Boechat seja lembrado para sempre. Pode ser nome de rua ou qualquer local novo que tenha a ver com ele. Detalhe: peço que não proponha que o seu nome substitua nomes de rua ou de locais já consagrados, o que para mim, não é o idealr

  4. Salve Gilson!! Obrigado pelo texto sobre nosso amigo Boechat! Quero um dia poder te conhecer, sou tb de Niterói, mas saí muito cedo. Acho que será maravilhoso podermos compartilhar estórias sobre esse amigo que tão precocemente nos deixou e tb a todo o Brasil, pois foi absolutamente incrível perceber a comoção nacional e a dimensão que nosso querido tomou!!!
    Grande Abraço,
    João Bird.

  5. Uma pena que essoas desta grandiosidade se vai taõ , é uma perda irreparavel um amigo que entrava em nossas casas todos os dias , vai deixar saudades.

  6. Ao Gilson, meus parabéns , a amizade não tem barreiras ideológicas, ainda mais entre verdadeiros jornalistas, que honram a profissão, belo texto sobre seu amigo que se foi, deixando uma imensa lacuna no jornalismo falado, escrito e televisivo. Mais uma vez Gilson, meus parabéns

  7. Lindo texto Gilson retrata uma amizade impar que se compara a perda de um irmão querido e do bem, mas Gilson por que só os bons se vão…

  8. Querido Gilson. Esse seu belíssimo texto sobre Boechat, com palavras tão simples quanto lindas, traduz de maneira muito clara a grande carga emotiva com que você o escreveu. “Amigo é coisa prá se guardar do lado esquerdo do peito, dentro do coração -MN”

  9. É tão difícil uma amizade linda como a de vocês. É de emocionar. Quando agente perde um ente querido como acabou de acontecer com você é muito dificil. O que tenho acrescentar é que aonde ele estiver que ele seja muito iluminado e você também. Uma amizade sincera, grandiosa e verdadeira nunca termina.

  10. Gilson ninguém falaria tão lindo sobre Ricardo Boechat como vc se expressou com saudade. Todos estão estarrecidos com o acontecido. Perder Boechat nos dando as notícias está sendo terrível! Um grande abraço

  11. Meu caro Gilson,
    sugiro que amigos de Boechat utilize este espaço para escrever estórias divertidas que aconteceram com ele.
    Eu por exemplo tive uma :
    Boechat foi meu contemporâneo de CEN, certa vez depois de muito tempo sem nos ver, estive com ele num desfile de escolas de samba que acontecia no sambódromo e naquela ocasião eu trabalhava na Defesa Civil da Prefeitura do Rio e já no final dos desfiles, eu tinha bebido além da conta. Então, fui surpreendido por uma voz no pé do meu ouvido : ” Buraco (meu apelido de colegio) se eu precisar da Defesa Civil, eu estou fudido ” e saiu rindo…

  12. Que lindo Gilson ! Muito raro esse sentimento ! Que Deus o tenha ! Talvez não saiba, mas cheguei a fazer 2 anos de jornalismo ! Sempre gostei dessa profissão de vocês ! Mas, o problema é que eu sempre fui apaixonado em ser Dj ! Profissão que comecei aos 16 anos de idade e que perdura até hoje com 53 anos ! Ele vai fazer muita falta a todos nós ! Gilson, aproveito para agradecer pela sua amizade e que eu possa continuar sendo o seu Dj preferido ! Rs !

    1. Que texto lindo, meu querido amigo-irmão, Gilson! Não esperava outra coisa de você, afinal conheço-o muito bem para saber da grandeza da sua alma e do tamanho do seu coração, onde cabem milhões de amigos! Boechat deixa saudades e lembranças dos bons tempos de Niterói! Aproveito meu comentário para mandar um beijo a Plínio Jordão, outra pessoa sensacional, que não vejo há anos!!!

  13. Gilson
    Sei a dor que está sentindo com a perda do amigo e irmão.
    Acompanhei você a sua doença e vi como o Boechat foi incansável acompanham do o seu tratamento com o Dr Salgado.
    A perda é enorme.

  14. O JORNALISMO DE QUALIDADE PERDEU UM DE SEUS ÍCONES.
    MUITAS VEZES, DISCORDEI DE SUAS IDÉIAS, MAS SEMPRE ADMIREI SUA POSTURA INDEPENDENTE.
    AMO O RÁDIO, E ELE DEIXARÁ UMA LACUNA DIFÍCIL DE SER PREENCHIDA.
    A RÁDIO BANDNEWS FM, JAMAIS SERÁ A MESMA SEM RICARDO BOECHAT!

  15. Ficou um vazio em todos nós q tivemos a oportunidade de conviver com ele, em Niterói, e no jornalismo sério q ele fazia..

  16. Uma perda inestimável! Um vazio enorme que dificilmente será preenchido!!! Umvaziinna TV, no rádio!!! Enfim….vazio vazio vazio!!! Que Deus o receba e conforte família e amigos!!!

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